A importância da fala para a psique humana é observada pelo papel crucial que ela desempenha na formação e manutenção da personalidade, especialmente na infância. Através da linguagem, as crianças começam a interpretar o mundo ao seu redor.

As palavras que ouvem e as conversas em que participam não apenas moldam sua personalidade, mas também influenciam suas escolhas e comportamentos futuros.Como tintas em uma tela em branco, as palavras da infância deixam marcas indeléveis, que orientam o indivíduo ao longo da vida, tanto consciente quanto inconscientemente.

Embora vários fatores influenciem a formação da personalidade, a fala é um dos mais poderosos. Ela pode ser usada para inspirar, ensinar e construir confiança, mas também pode ser manipuladora, criando inseguranças e desvalorização.

A maneira como nos comunicamos e as palavras que escolhemos têm um impacto profundo no desenvolvimento emocional e psicológico das crianças, influenciando sua jornada até a vida adulta.

A Psicanálise e o Poder da Fala

Sigmund Freud, o fundador da psicanálise, introduziu a ideia do aparelho psíquico, em sua primeira tópica, composto por três instâncias interligadas: o Consciente, o Pré-consciente e o Inconsciente.

O Consciente lida com o presente, processando informações de maneira clara, enquanto o Pré-consciente guarda informações que podem ser acessadas quando necessário. O Inconsciente, por outro lado, é um reservatório de sentimentos e desejos ocultos, que influenciam nossas decisões e comportamentos sem nossa percepção consciente.

Embora o Inconsciente seja inacessível diretamente ao Consciente, ele tem um impacto direto nas decisões, medos e impulsos.

A fala consegue interagir com essas três instâncias, revelando aspectos simbólicos e psicológicos que podem ser identificados por meio das palavras que usamos. Através da linguagem, podemos acessar não apenas pensamentos racionais, mas também traumas e desejos ocultos, exercendo grande influência sobre a personalidade de outros, fato que revela a importância da fala para a psique humana.

A Fala e o Método Catártico de Freud

O método catártico, desenvolvido por Freud, foi um marco na terapia psicanalítica. Ele foi baseado no caso de Anna O., pseudônimo de Bertha Pappenheim, paciente diagnosticada com histeria.

Freud percebeu, após uma reclamação de sua paciente para que lhe deixasse falar sem ser interrompida que, ao permitir que os pacientes falassem livremente sobre suas emoções e traumas, poderia ocorrer uma liberação emocional conhecida como ab-reação, sem a necessidade de hipnose, técnica que ele utilizava antes de desenvolver o método catártico.

Assim, ele formulou a técnica da “associação livre”, onde o paciente fala sem censura, permitindo que os sentimentos reprimidos fossem acessados e processados.

Nesse sentido, o Dicionário de Psicanálise de Roudinesco (1998) descreve a catárse como o:

procedimento terapêutico pelo qual um sujeito consegue eliminar seus afetos patogênicos ao reviver os acontecimentos traumáticos a eles ligados“.

Em outras palavras, ao falar sobre um trauma, o indivíduo experimenta as emoções associadas, o que libera a tensão emocional e elimina os sintomas. Isso significa que não basta falar sobre algo, sendo necessário sentir e digerir aquilo que é dito.

Este processo é essencial para a cura emocional, pois permite reinterpretar o passado e transformar o trauma em um elemento de crescimento pessoal.

A Importância da Fala para a Psique Humana: Na formação e na manutenção

A fala tem uma dupla função essencial: ela não só molda a personalidade desde a infância, mas também ajuda a manter o equilíbrio psíquico ao longo da vida. Ela permite que emoções reprimidas, desejos e pulsões ocultas no Inconsciente sejam trazidas à tona e processadas.

Esse processo de “tradução” do Inconsciente para o Consciente possibilita a descarga emocional necessária para superar os traumas.

No contexto terapêutico, a fala se torna uma ferramenta poderosa para ressignificar os traumas e aliviar os sintomas emocionais. Ao reviver as emoções ligadas aos eventos traumáticos, o paciente pode experimentar uma transformação profunda, curando feridas psicológicas e reestruturando sua psique.

A Fala como Instrumento de Cura Emocional

Na Medicina Chinesa Clássica, Sun Si Miau, grande médico da antiguidade, já dizia que todo tratamento médico deve ser precedido de uma boa conversa. Destacava que além dos cuidados físicos, seria indispensável ao médico o cuidado com a saúde emocional. ( Sun Si Miao viveu entre 581-682, durante as Dinastias Sui: 581-618 e Tang:618-907).

Para a psicanálise, a fala não é apenas uma ferramenta de comunicação; ela é uma chave para a cura emocional. Ao permitir que o indivíduo se conecte com suas emoções mais profundas e as verbalize, a fala facilita a liberação de tensões reprimidas e oferece uma nova perspectiva sobre eventos passados.

Esse processo de “catarse”, ou purificação emocional, é fundamental para a terapia e o bem-estar psicológico. A eficácia da fala como método terapêutico é amplamente reconhecida, tanto na psicanálise como na psicologia, onde a articulação das emoções ocultas ajuda no crescimento e na cura emocional.

Além disso, a fala fortalece os laços sociais, constrói confiança e promove a empatia. Quando usada com consciência e respeito, ela pode ser uma ferramenta poderosa para melhorar a saúde mental e emocional, tanto no nível individual quanto coletivo.

Segundo Freud, isso ocorre porque a fala se serve como substituto da ação, ou seja, por meio da linguagem, o afeto traumático pode ser ab-reagido (descarregado, liberado) quase com a mesma eficácia de uma reação concreta, seja por meio de um reflexo ou de uma vingança, por exemplo.

Há de se pontuar que a liberação dos sintomas não ocorre pelo simples ato de falar dos problemas e frustrações, mas sim, pela revivência das tensões emocionais que são descarregadas enquanto o indivíduo fala.

Em outras palavras, a fala deve ser acompanhada da carga emocional que gerou o afeto patogênico, pois, apenas quando sentimos aquilo que falamos, temos a oportunidade de reagir, ainda que simbolicamente, aos afetos traumáticos e, assim, ab-reagí-los para, posteriormente, dar-lhes novos significados, por meio das associações mentais. Trata-se do famoso “desabafar chorando” ou “desabafar com raiva, fúria”, bem como a interpretação desses eventos.

O Impacto da Fala nas Relações e no Bem-Estar Psicológico

As palavras têm o poder de construir ou destruir, de derrubar ou de levantar, de criar laços ou de gerar desentendimentos. Uma comunicação cuidadosa e empática pode promover a cura, mas palavras ditas sem reflexão podem deixar cicatrizes duradouras.

Por isso, é essencial cultivar uma comunicação consciente, reconhecendo o impacto profundo que nossas palavras têm no bem-estar psicológico de nós mesmos e dos outros.

A Fala como Chave para o Autoconhecimento

Dessa forma, a fala é mais do que um simples meio de comunicação; é um instrumento essencial para a formação e manutenção da saúde mental. Ela é fundamental para o autoconhecimento, permitindo que o indivíduo revele suas emoções mais profundas e as enfrente de maneira saudável.

Ao compreender o poder da fala e usá-la de forma responsável, podemos não apenas melhorar nossa própria vida, mas também contribuir positivamente para a vida dos outros. Assim, a fala se revela como uma ponte vital entre o mundo interno e o externo, permitindo a expressão de sentimentos muitas vezes não verbalizados.

Esse processo de fala e sentir simultaneamente é o que proporciona a verdadeira catarse, essencial para a cura psíquica e emocional.

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Referências Bibliográficas:

FOCHESSATO, Waleska Pessato Farenzena. A cura pela fala. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte-MG, n. 36, p. 165–172. Dezembro/2011 2011.

FREUD, S. Estudos sobre a histeria (1893-1895). In: Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. II.

FREUD, S. O ego e o id e outros trabalhos (1923-1925). In: Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, v. XIX.